Antes do texto em si é necessário uma explicação de por que decidi
pô-lo aqui. Há vários dias uma certa jornalista de certo blog jornalístico (a
redundância acaba sendo necessária por questões de contexto, mesmo que não haja
motivo pra incluir nenhum nome) publicou análise própria sobre o texto “O
Jornalismo Pós-Trump”, da jornalista Daniela Pinheiro, revista Piauí. Apesar de
não concordar com o posicionamento das mesmas, gostei do texto e postei um
comentário, que foi retido pra análise da moderação. Ocasionalmente verificava
o que tinha acontecido, e sempre me deparava com a caixa de comentários vazia. Atribuí
isso a simples questão de prioridade ao tempo e deixei passar. Hoje, porém,
estou mais propenso a aceitar que meu comentário simplesmente não foi aceito
pela moderação. Decidi ir direto à fonte e comentar na matéria original da
Daniela Pinheiro, no site da Revista Piauí. Pra minha surpresa, não há caixa de
comentários. Talvez seja ativa apenas aos assinantes, mas mesmo assim diz
alguma coisa sobre esse Jornalismo que escolhe o que quer ouvir e de quem quer
ouvir. Não que haja alguma surpresa nisso, mas se trata de algo que valeria uma
discussão mais a fundo. E já que, de algum modo, me tornei responsável pela
minha própria voz, este é o meu espaço, embora em circunstâncias normais esse
post nem sequer existiria. Isso posto de lado, meu comentário acaba se tornando
voltado diretamente ao texto original da Daniela Pinheiro, que não é ruim
apesar de abordar o problema proposto de um ângulo tanto egoísta. Pelo menos
alguém teve senso de apontar uma nova linha de raciocínio.
Uma boa reflexão e um texto muito bem
embasado, mas penso que alguns detalhes menores – ainda que relevantes – foram
deixados de fora, inclusive pela própria Daniela Pinheiro. Então, se me permite
o espaço... [Mantive a frase pra cuidar a
fidelidade do texto original, embora seja óbvio que o tal espaço não me foi
permitido]
Houve um candidato muito mais bem preparado
que Donald Trump pra concorrer pelo Partido Republicano: Ted Cruz. Chegou
inclusive a ameaçar derrotá-lo durante as primárias. No entanto, cedeu sua
vaga. Por quê? Porque Cruz entendia que os Estados Unidos não acreditariam num
Republicano que parecesse só a promessa de uma extensão do Governo Bush,
precisavam de alguém que, antes de tudo, mostrasse saber de verdade os
problemas do país e como resolvê-los. Se, por milagre, Ted Cruz fosse eleito,
seria pouco mais que uma fachada. Trump era o líder que precisavam lançar, e
assim o fizeram. O texto fala numa falha do Jornalismo em separar o Trump
político do Trump celebridade. Uma falha maior ainda é ignorar que o Trump
político NUNCA existiu. Sempre foi o Trump pensador, observador, estrategista e
homem de negócios. Manipulou o Jornalismo? É ÓBVIO QUE SIM! PORQUE O JORNALISMO
DE HOJE É IDIOTA O SUFICIENTE PRA SER PREVISÍVEL! Sendo eu mesmo um graduando
em Jornalismo, posso afirmar sem medo que o desafio principal do jornalista – e
seguramente o mais ignorado por uma fatia gigante dos profissionais – é saber o
que fazer sem se permitir ficar arrogante. A maior glória de um jornalista é um
Pulitzer, e não um texto bem escrito e bem apurado.
Os jornalistas americanos ficaram putos
porque os discursos de Trump não eram destinados a eles, e sim diretamente aos
potenciais eleitores. O Jornalismo atual não aguenta que a autoridade tenha um
canal direto ao público, precisa ser o filtro ou então perde sua razão de
existir. Gilbert K. Chesterton (que era jornalista entre diversas outras
coisas) avistou isso muito bem quando disse: "O Jornalismo consiste largamente
em dizer que Lorde Jones morreu a pessoas que nunca souberam que Lorde Jones
estava vivo". Os jornalistas, vamos falar sério, gostam de soltar informações
de acordo com o impacto que eles querem que tenha no público. Um exemplo
excelente disso é justamente a polêmica do muro. "Ah, é um intolerante, quer
fechar os Estados Unidos, não gosta dos mexicanos, não gosta dos latinos", etc.
etc. etc.. Tudo porque queria aumentar o controle das fronteiras e manter os
imigrantes dentro da lei. Mas o que realmente interessa é: se um muro na
fronteira dos Estados Unidos com o México é uma ideia tão intolerável e
preconceituosa, por que as pessoas iriam querer eleger a esposa do homem que
teve a ideia original? Convenientemente o Jornalismo deixou essa informação de
fora, o primeiro muro foi idealizado E CONSTRUÍDO pela gestão de Bill Clinton.
E a primeira vez que se falou numa expansão foi em 2006, quando Barack Obama
estava na Casa Branca. E o Jornalismo só viu problemas quando foi Trump que
falou nisso.
Baron foi a única fonte dessa matéria que
realmente parecia interessado em fazer Jornalismo sério e disse verdades incontestáveis: "Além de sermos ruins em previsões, somos dados a afazer muitas suposições acerca de tudo. É preciso ter muito cuidado com isso [...] O antídoto de previsões erradas é ir para a rua e apurar. Formule perguntas e as responda objetivamente, não presuma nada", a frase mais verdadeira de todo o texto. O Jornalismo um dia serviu pra dizer às pessoas o que estava acontecendo. Em algum momento do caminho esse propósito se perdeu quase que por completo, e atualmente o Jornalismo faz um esforço sobre-humano pra dizer às pessoas o que elas devem fazer. A pior parte é ver quanta gente apoia com fervorosidade o Jornalismo como "quarto poder". Isso é muito prejudicial. Valida o jornalista a fazer quase qualquer coisa porque "o público precisa saber" - e isso simplesmente por que o jornalista quer que seja assim. Depois que Trump foi eleito, os jornalistas tentaram uma última cartada - as promessas de campanha. Quando perceberam que o Presidente eleito estava realmente disposto a cumprir cada uma delas, e que efetivamente estava prestes a cumprir algumas, tudo acabou, os jornalistas finalmente admitiram que não tinham a menor ideia do que ia acontecer a seguir.
O que quero enfatizar com isso é o problema que o Jornalismo tem nas mãos ao se dar uma importância absurdamente maior do que a que realmente tem. "O Jornalismo muda o mundo", "o Jornalismo é o espelho da realidade", "o Jornalismo é o meio de comunicação mais confiável", mas é incompreensível para os jornalistas o fato de que o mundo gira independente da vontade deles. No caso da eleição de Trump, o candidato já sabia que seria vencedor exatamente porque os jornais davam como certa a vitória dos Democratas. Hillary Clinton culpou todo mundo por sua derrota, menos a sua própria inépcia. Chegou-se ao absurdo de recontar os votos em Winsconsin e descobrir mais de 100 votos extras pra Trump. Curiosamente, não há na matéria inteira nenhuma palavra sobre a atuação de Hillary em Benghazi. Engraçado como enchem a boca pra dizer que Trump é “misógino” (isso vindo do mesmo espaço que parece esquecer nossos próprios misóginos, como Lula e Zé de Abreu), mas acha que seria melhor empossar na Casa Branca uma potencial cúmplice de terrorismo – e posso usar exatamente esse termo, porque se a palavra basta como acusação, Trump é tão misógino quanto Hillary é cúmplice de terrorismo.
O que quero enfatizar com isso é o problema que o Jornalismo tem nas mãos ao se dar uma importância absurdamente maior do que a que realmente tem. "O Jornalismo muda o mundo", "o Jornalismo é o espelho da realidade", "o Jornalismo é o meio de comunicação mais confiável", mas é incompreensível para os jornalistas o fato de que o mundo gira independente da vontade deles. No caso da eleição de Trump, o candidato já sabia que seria vencedor exatamente porque os jornais davam como certa a vitória dos Democratas. Hillary Clinton culpou todo mundo por sua derrota, menos a sua própria inépcia. Chegou-se ao absurdo de recontar os votos em Winsconsin e descobrir mais de 100 votos extras pra Trump. Curiosamente, não há na matéria inteira nenhuma palavra sobre a atuação de Hillary em Benghazi. Engraçado como enchem a boca pra dizer que Trump é “misógino” (isso vindo do mesmo espaço que parece esquecer nossos próprios misóginos, como Lula e Zé de Abreu), mas acha que seria melhor empossar na Casa Branca uma potencial cúmplice de terrorismo – e posso usar exatamente esse termo, porque se a palavra basta como acusação, Trump é tão misógino quanto Hillary é cúmplice de terrorismo.
Donald Trump na
Casa Branca representa, sim, uma ameaça direta ao Jornalismo. Não porque
aumentará o risco de censura, mas porque forçará o Jornalismo a sair de sua
zona de conforto e voltar às raízes, com sapato sujo, trabalho pesado e sem a
pretensão de produzir videntes e ‘especialistas’ que sabem de tudo sem
realmente saberem de nada. E é justamente por isso que acabo tendo um certo respeito pela Daniela Pinheiro, ainda que discorde categoricamente de quase todas as conclusões dela. Deixou bem clara, sem filtro e sem rodeios, a sua posição ideológica, o que é bastante honesto considerando todos os outros que ainda tentam se esconder naquela cortina de fumaça chamada "imparcialidade", obviamente inexistente. E, trazendo Chesterton de volta: "O Jornalismo é popular, mas é popular principalmente como ficção. A vida é um mundo, e a vida vista nos jornais é outro".